segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Dos limites do poder executivo


O Estado só pode contrair dívida até aos limites autorizados pela AR, só pode dar garantias pessoais nas mesmas condições. mas pode dar garantias contra "risco jurídico" futuro e incerto sem qualquer limite no contexto de uma privatização? Um verdadeiro cheque em branco, cujos contronos não podem deixar de nos preocupar.

A propósito desta notícia.

Frustrações em época natalícia



terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Opinião Pública

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Repetir o óbvio

Mas pronto, mais uma vez:

Afinal, o que pode fazer o BCE?

Muitas vozes têm dito que o BCE estará já a fazer mais do que o mandato que lhe está atribuído, desde logo as vindas do Bundesbank e de certos sectores do pensamento económico.
Alegam, e o próprio BCE tem suportado esta visão, que o banco tem como objectivo único manter a inflação próxima dos 2%, isto é, estabilidade de preços e que qualquer outro objectivo lhe está vedado.
Este racional é muitas vezes invocado para explicar as diferenças entre as políticas mais agressivas no combate à crise da Reserva Federal Norte-Americana, do Banco de Inglaterra ou, mais recentemente, do Banco Central Japonês.
Nada mais errado, como uma leitura dos Tratados permite perceber. Desde logo, o BCE não tem um mandato único: tem um mandato primário (na redacção inglesa dos Tratados) ou primordial, na discutível versão portuguesa.
Em qualquer caso, o que diz o Artigo 127.º n.º 1 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia é o seguinte:

“O objectivo primordial do Sistema Europeu de Bancos Centrais, adiante designado «SEBC», é a manutenção da estabilidade dos preços.”

Primordial, ou primário indicam, desde logo, que é um, e o principal, mas não o único. Aspecto que é reforçado pela continuação do mesmo artigo 127.º n.º 1 que esclarece:

“Sem prejuízo do objectivo da estabilidade dos preços, o SEBC apoiará as políticas económicas gerais na União tendo em vista contribuir para a realização dos objectivos da União tal como se encontram definidos no artigo 3.o do Tratado da União Europeia.”

Literalmente, o que o tratado diz é que, desde que não se comprometa o objectivo de estabilidade de preços (no médio e longo prazo, acrescentamos nós) o BCE tem como mandato, não como opção que livremente exercerá, mas como uma obrigação que sobre ele impende, contribuir para a prossecução dos fins da União fixados no Artigo 3.º do Tratado da União Europeia.
O qual, por sua vez, dispõe (destaques nossos):

“A União estabelece um mercado interno. Empenha-se no desenvolvimento sustentável da Europa, assente num crescimento económico equilibrado e na estabilidade dos preços, numa economia social de mercado altamente competitiva que tenha como meta o pleno emprego e o progresso social e num elevado nível de protecção e de melhoramento da qualidade do ambiente. A União fomenta o progresso científico e tecnológico.
A União combate a exclusão social e as discriminações e promove a justiça e a protecção sociais, a igualdade entre homens e mulheres, a solidariedade entre as gerações e a protecção dos direitos da criança.
A União promove a coesão económica, social e territorial, e a solidariedade entre os Estados-Membros.”

Ora no actual contexto, quer numa visão de curto prazo, quer numa visão de médio-longo prazo a Europa não enfrenta pressões inflacionistas. 
Aliás, se algum risco se tem de assumir é a possibilidade de termos um cenário de deflação com taxas de juro baixas, o tipo de ciclo vicioso em que o Japão esteve durante muitos anos.
Logo, se o objectivo primordial está atingido, o BCE não só pode como deve tentar contribuir para a realização dos demais objectivos. 
Assim, uma política mais agressiva indexada, por exemplo, como fez recentemente a Reserva Federal Norte-americana, a um dado objectivo de baixa do desemprego é não só permitida como imposta pelos Tratados.
E se assim é, porque não está a discussão focada neste aspecto?

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Opinião Pública

No Diário Económico de hoje:


‘Whatever it takes’, mesmo? 

Com uns anos de atraso em relação à sociedade civil a Assembleia da República, por iniciativa do Partido Socialista, vai finalmente discutir se a dívida portuguesa é pagável. A resposta àquela questão, no contexto que a Europa atravessa, depende muito das expectativas do que seja a evolução da Economia.


Sem crescimento a reestruturação - que o Governo já assume discretamente, nomeadamente em operações de troca de dívida e no planeamento do reembolso antecipado ao FMI - será inglória. Acabaremos sempre num problema de capacidade de pagar. Do que precisamos é de crescimento económico, e urgentemente.

É por isto que o pífio Plano Juncker não serve. É demasiado pouco, demasiado tarde e demasiado lento. É preciso complementar tudo isto com uma política monetária audaz. ‘Whatever it takes', disse Draghi, e deve mesmo ser o que for preciso, sem tabus.

Já em Setembro ("Acabar o euro", Diário Económico de 03/09/14) tínhamos alertado para o artigo da Foreign Affairs de Mark Blyth e Eric Lonergan que, aos ombros de Milton Friedman e Ben Bernanke vieram propor um "QE for the people", ideia que tem começado a ganhar visibilidade. Em bom português, injectar dinheiro directamente nas famílias, em vez de o fazer no sistema financeiro.

Entre nós, Eduardo Paz Ferreira apontou no mesmo sentido ("Paroles, Paroles", Expresso de 06/12/2014) citando ainda Werner Munchau, Martin Wolf ou Adair Turner como nomes que cada vez mais integram as alas ditas radicais.

Lá fora os sinais são mais do que evidentes, desde Simon Jenkins (ex-editor do Times) no The Guardian a John Muellbauer, em Oxford. E até do lado dos mercados, pela mão do Economista-Chefe do Citigroup, Willem Buiter temos sinais importantes (cf. "The Simple Analytics of Helicopter Money: Why It Works - Always", Economics: The Open-Access, Open-Assessment E-Journal, 8 (2014-28)).

Os modelos americano (que funcionou) e japonês (que está em dificuldades) de QE dificilmente funcionarão na Europa, face a um sistema financeiro zombie que nem à força de empréstimos de longo prazo grátis do BCE (os chamados LTRO) dá sinais de vida.

Na experiência americana de 2001, em que foi dado um alívio nos descontos pessoais para a segurança social, mesmo quantias relativamente modestas traduziram-se em crescimento económico, num aumento da qualidade de vida da população mais pobre e numa melhoria imediata das contas públicas por via de uma melhor receita fiscal.

O reverso da medalha será um eventual pequeno aumento da inflação. Mas um pequeno aumento da inflação é precisamente o que precisamos, longe que estamos do objectivo de 2% que o próprio BCE advoga.

O que falta? Convencer os alemães ou vencê-los em votação no BCE. Falta, em suma, vontade política. O projecto europeu viverá ou morrerá em função disto. É altura de o começarmos a aceitar.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Opinião Pública



No Diário Económico de sexta:


Crime e Castigo

Se tirarmos um paralelo à narrativa de Dostoiévski o que se apura nas audições parlamentares ao BES/GES é que roubar um euro é um acto humano, mas pulverizar milhares de milhões é um acontecimento fortuito.

Não o podiam evitar os que geriam estas empresas, não o podiam evitar as entidades reguladoras cujo mandato é evitar que coisas destas aconteçam, não o podia, por fim, evitar o Governo que em nome de todos nós conduz os destinos do País, mas que neste assunto nada fez excepto, ex post facto, despejar milhares de milhões de euros dos contribuintes em cima do problema.

Ricardo Salgado era o líder do grupo e do banco mas foi ao Parlamento imputar culpas à crise (tem costas largas), ao contabilista (esse mordomo dos tempos modernos), mas principalmente ao Banco de Portugal. A tese central: por ter sido demasiado exigente quer no tipo de medidas (ignoradas quase todas) quer no calendário imposto (mas não cumprido) terá provocado o desaparecimento do BES e a falência do GES.

O Banco de Portugal exagerou na supervisão? Carlos Costa diz que não. Diz, também ele, que a culpa não é dele, que não podia ter feito mais. Mandou (rectius: persuadiu) mas não foi ouvido. Os pareceres adquiridos por Ricardo Salgado não lhe permitiam agir, a jurisprudência dos Tribunais tolhia-o, e os factos essenciais escaparam-lhe. Mais para Pilatos que para Porfiri Pietróvitch, em suma.

Tem-se dito muitas vezes que atacar o supervisor é desculpar o infractor. Não é: o facto de um crime ter autor e ser ele o criminoso não desculpa o polícia que o deixou agir debaixo do seu olhar desatento e negligente, mãos tolhidas atrás das costas por equívocos só seus.

Em tudo isto, o que se pode ver? Um monumento tão caro quanto hediondo ao funcionamento do mercado, à regulação que temos, e ao sentido de Estado de quem nos governa. Para sumário de uma nação não está mal, não senhor.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Coisas que escapam


Porque não foi televisionada passou ao lado da torrente informativa sobre as audições parlamentares do affaire BES a audição da Técnica do Banco de Portugal que integra a equipa de acompanhamento permanente do BES, Susana Caixinha. 

A audição não é nem foi secreta (estando disponíveis quer a declaração incial quer o registo aúdio da parte relativa a perguntas e respostas) mas dela não se fizeram grandes manchetes nem muitas noticias. 

Acontece que o que ali foi dito é instrumental para compreender o que se passou do lado da supervisão.  

É a procura, estúpidos


sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Obrigatório ler


Sobre a complexa questão da idoneidade temos uma nota técnica (não assinada, o que não deixa de ser original, convenhamos) toda ela assente num erro de perspectiva: no exercício dos seus poderes o BdP não se deve preocupar primeiro consigo mas sim com os cidadãos que dependem da sua oportuna, eficaz e decidida actuação.

Já só faltam os pareceres de Coimbra, por aí citados mas ainda não públicos.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Retrato de um país em 10 imagens (não recomendado a pessoas sensíveis)


O retrato completo está no Anuário 2013 do INE (completo aqui), partes seleccionadas mais ou menos ao calhas ficam já aqui. 10 imagens para perceber melhor Portugal:

1) Somos cada vez menos activos e nem tudo isto é demográfico



2) Temos a geração mais qualificada de sempre, de sempre. Saberemos não a desperdiçar?



3)  Não, ainda não estamos a criar emprego. E sim, estes números são mais significativos do que a estatística do desemprego, demasiado "trabalhada". O pouco emprego que se cria é precário e mesmo assim não compensa quebra do emprego não precário. Já se intuia, mas agora sabe-se:


 
4) E, com alguma surpresa, essa pequena criação é na faixa etária mais elevada. Os jovens qualificados ficam de fora. Não é propriamente sustentável a prazo:

 

5)  Quando nos íamos aproximar da média Europeia em termos de igualdade na distribuição de rendimentos, comecámos a divergir. E sem sinais de retomar a convergência:



6) Temos menos transferências sociais do que a média da UE, ou seja, eles têm mais estado social que nós:



7) Somos um país de pequenas, micro e nano empresas como dizia o outro. É por isso que reduzir o IRC serve de pouco para a esmagadora maioria das empresas (mais de 95%):



8) O que falhou na austeridade? Tudo. A austeridade não funciona porque o que ganhámos em exportações mais do que perdemos em consumo interno e o PIB afundou mais de 6%



9)  Defina brutal aumento de impostos? É fácil:




10) Há alguma despesa do Estado a subir? Há, os juros: