quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Escolhas


Um Orçamento de Estado é feito de escolhas. Muitas. E muitas são discutíveis. Este Orçamento tem tantas escolhas controversas que algumas estão a escapar  a um olhar mais atento ou mesmo a uma breve conversa.

Isto significa que ficam por fazer perguntas que deveriam ser feitas e por obter respostas que são indispensáveis para se poder discutir o mérito das escolhas.

Por exemplo, o Estado escolheu aumentar a dívida pública em quase 4 mil milhões de euros para reembolsar antecipadamente a CGD pelas dívidas dos veículos que ficaram com os créditos do BPN que o BIC não quis no âmbito da privatização.

É por isso que Mapa 7 capítulo 3 (Ministério das Finanças) aparecem a Parups, S.A. e Parvalorem, S.A. com despesas de 597 408 470 € e 3 320 628 739€ respectivamente.

Naturalmente, no mapa 5, para as mesmas entidades, são inscritos os mesmos valores como receita.

Logo, são verbas que "entram" e "saem". De onde vêm e para onde vão?

Vêm de emissão de dívida pública e vão para a CGD.

E era preciso fazer isto este ano, logo este ano? Não, como explica lá no meio o Relatório do OE, estes empréstimos podem ser reembolsados até 2020 ou 2021:

“A dívida contraída pelas sociedades Parvalorem e Parups junto da Caixa Geral de Depósitos, na sua maioria com garantia do Estado, tem o seu vencimento em 2020 e 2021.”

É dito que esta operação é favorável porque haveria uma “redução dos juros pagos pelas Administrações Públicas”.

Fixados os dados objectivos, ficam as perguntas:

1) Qual a redução de juros? Quanto vale?

2) O que se poupa em juros compensa o eventual efeito recessivo de emitir esta dívida pública hoje?

3) Não seria preferível entender que os empréstimos poderiam e deveriam ser reeembolsados com o que for sendo possível cobrar dos créditos com que o Estado ficou, sabendo-se que o próprio Relatório diz que esses créditos, já consideradas as imparidades valem mais de 3 MM€, sendo que pode ser mais ou pode ser menos e só na liquidação das operações se pode saber ao certo?

4) Não seria preferível, no fim, em 2020, emitir dívida, se necessário, para honrar a garantia pelo valor estritamente necessário? Como é que esse custo compara com o de fazer a operação hoje pela totalidade do valor? É maior? Menor?

5) Este empréstimo adicional atira o total da dívida para mais do que os 120%, na prática. Podia ser menos 2 a 3% se esta operação não se fizesse. Isto não é relevante?   

6) Qual a vantagem de desonerar a CGD já? Isso terá alguma coisa a ver com uma eventual intenção de privatização?

Nota: Dados retirados, todos, dos documentos do Ministério das Finanças, que são públicos.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Quantificações


No meu texto de ontem disse que:

Há a questão fiscal, em que a progressividade do IRS se degrada, sendo menos afectados os que ganham mais do que 160.000€/ano do que os que ganham 8.000€/ano.
 
Esta afirmação pode parecer pouco fundamentada por si. Não é. Tem, contudo, uma gralha (deveriam ser 10.000 e não 8.000 ali em cima).

é importante olhar para os números. Especialmente num contexto em que o Ministro das Finanças publicamente diz que a progressividade do imposto se mantém ou até mesmo aumenta.
 
Mas a nossa Constituição não se satisfaz com uma mera progressividade do IRS meramente simbólica.
 
A progressividade surge na Constituição como um instrumento de justiça social e redistribuição de riqueza. Há quem não goste dessa ideia. Mas, goste-se ou não, é esse o actual texto constitucional.
 
Basta olhar para as simulações do IRS (vejam-se as do Diário Económico)

Para aquilo a que se chamava classe média e média baixa com rendimentos entre 1.500 e 2.250 € mês por agregado familiar as variações são sempre acima de 40% de imposto a mais, podendo em casos extremos chegar a 200%.
 
Os muito ricos, com vencimentos acima de 25.000€ mês por agregado familiar nunca excede os 18% de imposto a mais.
 
E não é só um problema jurídico de constitucionalidade. A verdade é que o sistema fica menos progressivo e menos redistributivo.
 
Se o Tribunal Constitucional fará uma leitura mais formalísta – desde que haja um mínimo de progressividade e redistribuição cumpre-se o texto constitucional – ou irá antes para uma tese de não retrocesso do grau de cumprimento do objectivo de progressividade e redistribuição acaba por ser o que está em causa. 
 
Qualquer que a decisão seja ela será, espera-se, uma decisão mais densa e fundamentada do que a declarou a não constitucionalidade do corte dos subsídios que, ruído mediático à parte, deixou um pouco a desejar para quem quer perceber melhor o que entende o Tribunal. 
 
Esta escolha terá também um impacto económico particularmente perverso. A procura interna depende da classe média muito mais do que se pensa.
 
O efeito recessivo desta perda de progressividade fiscal vai ajudar a que, como diz o projecto de parecer do Conselho Económico e Social, possamos vir a ter dor sem ajustamento. Como aconteceu este ano.  

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Opinião Pública


Ainda sobre o muito que está em causa no Orçamento de Estado. No Diário Económico.

Em suma, a questão do OE não é o equílibrio das contas, para o qual em nada contribui. É o criarem-se condições para implementar subrepticiamente uma linha ideológica.

O que não coube ali, e ainda foi alguma coisa, virá para aqui mais logo.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Ideias que fazem pensar


Um país rico
 
Numa altura em que a crise domina o discurso público descobri que Portugal é um país rico.

Senão vejamos, como o Diário Económico noticiou (22.10.2012), num ano, de Junho de 2011 a Junho de 2012, sairam dos país 100.000 pessoas, a maioria (mais de 65.000) jovens, com idades entre os 25 e os 35 anos.

 Pior, daquele total de 65.000 jovens no último ano qualquer coisa como 44 mil terão emigrado no primeiro semestre deste ano. O que quer dizer que o fenómeno não está a acelerar, está a explodir.

 Se tivermos em conta que os que frequentam um curso superior o terminam, normalmente, em finais de Julho, o que por aí possa vir em termos de números de segundo semestre é assustador.

 E é aqui que percebemos que somos um país rico.

Um estudante custa, em média, ao Estado, mais de 5000€/ano. Um estudante estuda, ainda em média, vá, 9 anos, dos 6 aos 15. Ou dito de outra forma, da primeira classe ao 9.º ano. Uns não chegam lá, outros seguem para o Ensino Superior.

Temos, portanto, como colectividade, pelo menos 45.000€ investidos na formação de cada jovem. Números muito por baixo, com base em elementos da OCDE.

Isto vezes os 100.000 que emigraram dá uns respeitáveis 4,5 mil milhões de euros. O mesmo que o brutal aumento de impostos (IRS e não só), mais coisa menos coisa.

Estamos a perder jovens e menos jovens em cuja qualificação o país gasta muito dinheiro. Na prática, estamos a subsidiar ingleses, franceses e alemães e brasileiros e tantos outros com o que investimos em nós no passado.

Nós pagámos para que se formassem cá mas é lá longe que criarão riqueza, que financiarão aqueles Estados com os seus impostos, que darão sustentabilidade à segurança social.

É verdade que muitos reinvestirão aqui e aqui voltarão um dia. Este país sempre foi melhor do que os que nos governam a cada momento. Mas muitos não o farão. E não estamos em tempo de desperdiçar recursos.

Perante políticas públicas ilógicas resultados absurdos ... para onde quer que olhemos.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Opinião Pública


Sobre a proposta do OE 2013. No Diário Económico.

Dir-me-ão que faltam ali alternativas. É verdade. Dois mil caracteres não dão para tudo. Mas pode pensar-se em hipóteses a estudar. Uma espécie de pacote de alívio da austeridade.

Não há milagres, e prometê-los só quem for louco. A situação é difícil, mas também é verdade que recusar pensar em alternativas é igualmente louco. Para além de preguiçoso.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Inconstitucionalidades


A proposta de lei do orçamento viola, muito provavelmente, o contrato social. O contrato social está na Constituição. Este orçamento tem um risco de inconstitucionalidade elevadissímo ...

Este é apenas um deles.

Será que é desta que temos fiscalização preventiva da constitucionalidade da Lei do Orçamento? Devíamos.

Até porque o OE 2012 será rectificado agora e fica perfeitamente em condições de ver a sua vigência prorrogada para o ínicio do próximo ano se tal se mostrar necessário.  

Opinião pública

Sobre a Taxa Social Única ... aqui.