segunda-feira, 15 de dezembro de 2014
Opinião Pública
No Diário Económico de sexta:
Crime e Castigo
Se tirarmos um paralelo à narrativa de Dostoiévski o que se apura nas audições parlamentares ao BES/GES é que roubar um euro é um acto humano, mas pulverizar milhares de milhões é um acontecimento fortuito.
Não o podiam evitar os que geriam estas empresas, não o podiam evitar as entidades reguladoras cujo mandato é evitar que coisas destas aconteçam, não o podia, por fim, evitar o Governo que em nome de todos nós conduz os destinos do País, mas que neste assunto nada fez excepto, ex post facto, despejar milhares de milhões de euros dos contribuintes em cima do problema.
Ricardo Salgado era o líder do grupo e do banco mas foi ao Parlamento imputar culpas à crise (tem costas largas), ao contabilista (esse mordomo dos tempos modernos), mas principalmente ao Banco de Portugal. A tese central: por ter sido demasiado exigente quer no tipo de medidas (ignoradas quase todas) quer no calendário imposto (mas não cumprido) terá provocado o desaparecimento do BES e a falência do GES.
O Banco de Portugal exagerou na supervisão? Carlos Costa diz que não. Diz, também ele, que a culpa não é dele, que não podia ter feito mais. Mandou (rectius: persuadiu) mas não foi ouvido. Os pareceres adquiridos por Ricardo Salgado não lhe permitiam agir, a jurisprudência dos Tribunais tolhia-o, e os factos essenciais escaparam-lhe. Mais para Pilatos que para Porfiri Pietróvitch, em suma.
Tem-se dito muitas vezes que atacar o supervisor é desculpar o infractor. Não é: o facto de um crime ter autor e ser ele o criminoso não desculpa o polícia que o deixou agir debaixo do seu olhar desatento e negligente, mãos tolhidas atrás das costas por equívocos só seus.
Em tudo isto, o que se pode ver? Um monumento tão caro quanto hediondo ao funcionamento do mercado, à regulação que temos, e ao sentido de Estado de quem nos governa. Para sumário de uma nação não está mal, não senhor.