No meu texto de ontem disse que:
Há a questão fiscal, em que a progressividade do IRS se degrada, sendo menos afectados os que ganham mais do que 160.000€/ano do que os que ganham 8.000€/ano.
Esta afirmação pode parecer pouco fundamentada por si.
Não é. Tem, contudo, uma gralha (deveriam ser 10.000 e não 8.000 ali em cima).
é importante olhar para os números. Especialmente num contexto em que o Ministro das Finanças publicamente diz que a progressividade do imposto se mantém ou até mesmo aumenta.
é importante olhar para os números. Especialmente num contexto em que o Ministro das Finanças publicamente diz que a progressividade do imposto se mantém ou até mesmo aumenta.
Mas a nossa Constituição não se satisfaz com uma mera
progressividade do IRS meramente simbólica.
A progressividade surge na
Constituição como um instrumento de justiça social e redistribuição de riqueza.
Há quem não goste dessa ideia. Mas, goste-se ou não, é esse
o actual texto constitucional.
Basta olhar para as simulações do IRS (vejam-se as do
Diário Económico)
Para aquilo a que se chamava classe média e média baixa com rendimentos
entre 1.500 e 2.250 € mês por agregado familiar as variações são sempre acima de
40% de imposto a mais, podendo em casos extremos chegar a 200%.
Os muito ricos, com vencimentos acima de 25.000€ mês por
agregado familiar nunca excede os 18% de imposto a mais.
E não é só um problema jurídico de constitucionalidade. A
verdade é que o sistema fica menos progressivo e menos redistributivo.
Se o Tribunal Constitucional fará uma leitura mais
formalísta – desde que haja um mínimo de progressividade e redistribuição
cumpre-se o texto constitucional – ou irá antes para uma tese de não retrocesso
do grau de cumprimento do objectivo de progressividade e redistribuição acaba
por ser o que está em causa.
Qualquer que a decisão seja ela será, espera-se, uma decisão
mais densa e fundamentada do que a declarou a não constitucionalidade do corte
dos subsídios que, ruído mediático à parte, deixou um pouco a desejar para quem
quer perceber melhor o que entende o Tribunal.
Esta escolha terá também um impacto económico
particularmente perverso. A procura interna depende da classe média muito mais
do que se pensa.
O efeito recessivo desta perda de progressividade fiscal vai
ajudar a que, como diz o projecto de parecer do Conselho Económico e Social,
possamos vir a ter dor sem ajustamento. Como aconteceu este ano.