terça-feira, 12 de março de 2013
Depósito
O artigo do Económico de ontem:
Há quem esteja muito contente com as notícias vindas de Bruxelas de que existe disponibilidade para, “em princípio, considerar” (expressão tão europeia) um ajustamento das maturidades dos empréstimos europeus à Irlanda e a Portugal, para suavizar as amortizações de dívida nos próximos anos.
E nós com isso? O que é que isso diz aos portugueses?
Esse passo é consequência de sermos bons alunos? É o que nos dizem, de lá e de cá. Mas não. O primeiro país a beneficiar de uma extensão destas maturidades foi o pior dos alunos, a Grécia. Que beneficiou ainda de uma série de outras medidas que não estarão, "em princípio, a ser consideradas". E que, essas sim, providenciaram alívio. E não estou a contabilizar o não pagamento de parte da dívida, opção que Portugal não quer - sendo coisa diferente se não será um dia destes forçado a ir por aí, depois de acumular recessão em cima de recessão.
Na prática, esta decisão permitirá evitar picos de refinanciamento em 2015-2016 e 2020-2021. Mas não liberta um euro para aliviar a política de austeridade recessiva, que gera mais austeridade, que gera mais recessão. É uma decisão que agrada, isso sim, aos credores privados. Ao diluir os picos de pagamentos da dívida à ‘troika' estamos a garantir melhores condições para reembolsar os outros credores, os privados. E eles perceberam.
Os mercados percebem sempre. A divida a 5 e 10 anos nos mercados baixou o juro pedido. Não é que a medida seja má. Repito, devia era fazer parte de um pacote mais completo que estendesse a Portugal as condições da Grécia, mesmo que apenas na parte em que não prejudicam os credores, com poupanças de quase 15 mil milhões de euros. Isso poderia fazer a diferença. Esta medida? Esta medida destina-se a proteger os credores e não os devedores. Por isso entusiasma o Governo. E os mercados. Se é que se distinguem.
É uma medida contabilística e não substantiva, financeira e não económica, que pensa em números e não em pessoas. Dali não virá um euro para combater o desemprego, para parar a espiral recessiva, para melhorar a vida das pessoas. Em suma, pobre e mal-agradecido? Até pode ser. Mas não é disto que precisamos.
Ou, pelo menos, não é só disto que precisamos.
Marco Capitão Ferreira